gosto de olhar para as pessoas e fazer histórias, traçar perfil com base na postura, roupa. se estiverem a falar, com base no tom de voz e nas palavras que usam. gosto de tentar decifrar onde moram - a zona e o tipo de casa. e que tipo de decoração que escolhem. simples? novo rico? desleixado? vintage? clássico? gosto de tentar perceber em que caixinha encaixam ainda que acabem por não encaixar em nenhuma das que proponho a mim mesma. a parte gira deste jogo é que não há respostas certas. estou agora no autocarro do aeroporto a observar pessoas. algumas viajam em trabalho. outras em férias. das que vão em trabalho sinto alguma empatia. das que vão em férias tenho inveja. ao meu lado estão dois tipos com pinta de quem vai trabalhar. ao lado deles duas americanas de férias com sotaque que não as camufla de jeito algum. por outro lado, nesta senda da observação gosto que reparem em mim, mas não gosto de chamar a atenção. não sei se haverá alguém a fazer o meu exercício ao mesmo tempo. estarei eu a encaixar em alguma caixinha na cabeça do tipo aqui ao lado? estará a pensar onde vivo? se tenho cães? talvez se vejam alguns pêlos de pêpa e óscar na roupa. talvez ele não vá a esse detalhe. o mais provável é que esteja só a pensar na merda de vida que tem e o quanto está farto de viajar em trabalho. ou talvez esteja aliviado por passar umas noites fora de casa. longe dos filhos a ganir constantemente e da mulher a dizer-lhe que não faz nada em casa. que chega tarde, dorme fora e não se dedica o suficiente à família. ou talvez tenha só vento a passar na cabeça. terá os seus trinta e oito. vejo-o a morar num prédio em carnaxide. tem dois filhos: um com quatro anos e outro com seis. a mulher está grávida do terceiro. a decoração da casa é moderna de há quinze anos. não chega a ser vintage, mas também não segue a tendência. o filme está feito e estamos a levantar voo. vejo lisboa de cima. gosto sempre. de lisboa. e de a observar. beijinhos, muitos muitos.
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