foi o primeiro dia de interrail,
estava meio nervosa mas sem querer pensar muito nisso. no avião pensei que podia ser
giro fazer um diário de viagem. não tinha caderno, então peguei no saco que
serve para segurar meio litro de vomitado e comecei a escrever. eis as primeira
palavras, ainda meio atabalhoadas.
engraçado como há várias pessoas a viajar sozinhas. quando estamos em grupo não reparamos - ainda só no aeroporto. percebi a palavra airbus. é mesmo um autocarro do ar. o senhor que está sentado ao meu lado no avião está a sorver o chá e eu estou a ficar tensa. os comboios estão atrasados. estou com fome. saí de casa às dez da manhã e só chego a verona às onze e meia da noite. são quase nove e meia. comi uma foccacia de atum que podia ter sido eu a fazer em casa. ainda assim era boa. uma fatia custou seis euros. cheguei ao hostel já perto da meia noite. parece assim meio clandestino. comecei a receber parabéns, não estava preparada. de noite não me está a parecer fantástico. espero que amanhã surpreenda.
no dia seguinte ainda a escrever no saco de grego, mas já com um bocadinho mais de estrutura de pensamento. o primeiro dia foi atribulado. e isso nota-se ao ler-me, agora passado algum tempo. vamos ao dia trinta de julho.
são os meus anos, vinte e oito.
acordei em verona com o barulho de uma cama a guinchar. pelo ritmo creio ser um
casal feliz pela manhã. pode ser que seja um bom presságio. tá calor. vou tomar
banho.
verona é fofa, mas muito pequena. falei com uma bebé e uma avó que vieram da austrália. a avó disse que depois de dois anos em lockdown viaja-se para onde tiver de ser ou para onde se quiser. gostei desta avó.
fui à casa da julieta gastar quatro
euros e meio para ir a uma varanda ver a julieta ser assediada e ver uma cama
feita. em casa não sou assediada, nem tenho a cama feita. tenho uma varanda e
pago um pouco mais do que quatro paus. foi ao segundo dia que comprei este
diário. até agora estive a fazer cópia do saco de grego dos aviões.
já jantei e o dia dos anos está quase a
acabar. ia-me embora, mas pedi uma
picareta de vinho. como quem diz um bicchieri de vino, como me ensinou a
filipa. mas eu não retive. ao meu lado está um casal na
casa dos sessenta, setenta? têm um cão horroroso, mas tou a fingir que gosto
dele. dou-lhe festinhas. ele é muito fofo. parece um caniche gigante.
foi um dia de anos diferente,
talvez dos meus preferidos até agora. quando decidi passar os anos sozinha em
viagem estava com algum receio. sempre gostei de ter os meus perto de mim. e
agora não seria possível. no entanto foi o dia
de anos em que senti mais as pessoas perto de mim, embora estivessem tão longe.
a vida troca-nos muito as voltas. e ainda bem.
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